Nesta semana, a Série Avenida Paulista traz uma surpresa inédita. Pela primeira vez, a história de uma casa que existia na avenida será realizada por alguém que nela residiu, quando era pequena.
As lindas e inéditas fotos dos ambientes do casarão são acompanhadas das singelas lembranças de Anne de Bonneval, a quem agradecemos imensamente pela generosidade de compartilhar suas memórias.
Já tivemos a oportunidade de contar a história da casa e da família em um texto anterior da Série Avenida Paulista, para quem quiser conhecer, pode ser acessada clicando aqui.
Agora vamos adentrar neste belo casarão, junto com a Anne. Aproveitem!
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Quando me pediram para que eu escrevesse alguma coisa sobre cada “cômodo” de minha casa, me perguntei como escrever sobre a parte interna da casa, se eu só sei escrever sobre a Natureza mágica que havia fora dela?
Fiquei discutindo com essa dúvida até que concluí que se víamos a Natureza através das janelonas de cada “cômodo”, isso significava que a Natureza também estava dentro da casa, logo, havia Magia na casa toda.
A casa era uma fortaleza! Era uma casa que convidava à exploração e sabíamos que era uma exploração sem fim dado seu tamanho! Sempre encontrávamos algo para colocar no nosso tesouro – tesouro esse que constitui uma parte de minha Alma.
Pensando assim, lembro de cada canto, de cada interruptor de luz, de cada manchinha nos tacos e assoalhos que, às vezes, formavam monstros, outras vezes formavam fadas.
Lembro dos banheiros, onde era sempre uma festa, seja para jogar algodão molhado no teto, seja para deixar a torneira do meio do bidê aberta, para quem a abrisse – normalmente minha avó – se molhasse!
Nos divertíamos, tínhamos apenas ingenuidade, inocência e muita espiritualidade por conviver em um lugar assim tão mágico, um grande útero onde nada de ruim nos atingiria.
O quarto de minha mãe era o reduto, ali dormíamos quando estávamos doentes e ganhávamos presentes no dia que estávamos curados.
A penteadeira era um reduto de segredos, éramos proibidos de mexer nela! Às vezes eu me trancava dentro do armário de roupas de minha mãe e ficava! Por quanto tempo e por que, não faço a menor ideia!
Pelas janelonas víamos a palmeira imperial, o sol se pôr, a lua chegar e os sabiás indo dormir.
No fundo do quarto, ficava o banheiro, adorava as inúmeras gavetinhas cheias de tanta coisa, coisas esquecidas, coisas vencidas, lembranças que não podíamos sequer olhar, pois eram lembranças daqueles que se foram, portanto, sagradas e intocáveis.
Essas lembranças estavam pela casa toda, cada quarto tinha uma coisa, ou outra, quem sabe várias, mas tinha. Cada quarto morou uma tia, um tio, um avô, uma bisavó, que já não estavam mais por aqui quando eu cheguei, e naquele tempo não se desfaziam de absolutamente nada o que as vezes traz um peso terrível ao lugar.
O “salão branco” era a sala onde ficava a TV, preto e branco, onde eu e minha irmã mais velha ficávamos horas assistindo, com nossa avó cochilando que, vez por outra, acordava brava, porque a impedíamos de dormir rsrsrsrsrs. Lembro de Big Valley, Bonanza, Jeannie, a Feiticeira, Perdidos no Espaço e tantos outros. Essa é a lembrança do salão branco.
A sala principal, aquela que dá nas escadarias brancas, na lateral da casa (na 1ª foto acima, a escadaria da esquerda) era onde a família, os mais velhos, ficavam reunidos, e eu conseguia observar tudo, pois fazia de cada canto um esconderijo…
Éramos proibidos de entrar em casa durante o dia, tínhamos que ficar no jardim brincando, o que eu achava certíssimo e agradeço pois, descendendo e iniciada na espiritualidade, foi neste jardim que conheci a Magia e o Sagrado.
Entrava escondida, afinal havia tantas salas que era bem fácil circular sem ser notada, principalmente, para cortar uma fatia de queijo pegar pão no armariozinho da sala de jantar… nunca ninguém via nada.
Dessa sala eu guardo a memória de cada quadro pintado diretamente em madeira nobre. Eles ficavam acima de todas as portas, as cores ainda estão bem vivas na minha lembrança.
Aquele armário do fundo, sempre com papéis muito bem dobrados, que serviam para embrulhar “coisas”, um pote cheio de barbantes e fitas de diversas cores formas, que ficavam na porta da direita. Nas portas do meio haviam potes com balas e, na da esquerda, jornais velhos cuidadosamente dobrados. Nas gavetas em cima, sei lá, não lembro ou nunca mexi.
Cada sala com suas inúmeras portas que se interligavam, era um fascínio, pois cada espaço fornecia mil lugares para se esconder. As duas portas do fundo desta sala, davam para a sala de jantar.
Com suas vitrines que abrigavam pratarias centenárias, passadas de mãe para filho, desde a época das fazendas de Itu. Eram todas usadas nas festas de aniversário, essas festas eram comentadas em toda cidade!
Eram festas encantadas, imaginem esta sala de jantar repleta de docinhos e salgadinhos TODOS FEITOS EM CASA! Minhas queridas Luzia e Julia, que entraram para trabalhar em casa quando minha mãe tinha 11 anos, eram as encarregadas e responsáveis para que tudo saísse perfeito. Nós ficávamos até altas horas embrulhando balas de coco, enchendo bexiga e preparando tudo! Era O evento.
5 filhos – festa baile para as 2 mais velhas, o mágico para mim – pois é, na Magia desde pequena! Para minha irmã, o teatrinho, e para meu irmão, circo com churrasco! 5 festas por ano que aconteciam naquela casa encantada, quem foi lembra até hoje!
A sala de jantar, na hora do parabéns ficava lotada, a tal ponto que não conseguíamos nos mexer! Era muita alegria! A família sempre linda, minha avó sempre reluzente e meus pais chiquérrimos!
A sala de música era onde minha mãe passava muitas horas por dia tocando piano com Magda Tagliaferro, grande amiga da família, que me fascinava por conta do vermelho de seus cabelos. Essa era uma sala que eu não ficava muito, mas que me era gostosa por conta dos pianos.
A foto acima mostra meu quarto, a porta da direita dava para um terraço de pelo menos 50m2, com vista para o infinito jardim com suas 23 jabuticabeiras e uma população descomunal de pássaros. Até hoje quando escuto canto de sabiá, choro.
Até pouco tempo chorava de saudades da minha casa, hoje transformei esse choro em emoção por ter podido viver naquele pedaço de Céu, de Paraíso, de Éden e ter a oportunidade de contar para quem quiser ler! Meu quarto, meu reduto, quantas saudades!
A última foto é a sala que antecedia o quarto de minha avó. Se olharmos a foto da casa acima, o quarto de minha avó era onde estão aqueles três arcos acima da minha mãe – aquela menininha que aparece na foto com sua babá no terraço – as janelas mais para a direita, são as dessa sala.
Entre a sala e o quarto dela, havia um espaço que era o “boudoir” (sala privativa) dela. Lá ela se maquiava, se arrumava, tinha seus rituais e tudo aquilo me encantava, gavetinhas, cremes, maquiagem coisas escondidas….
Passeamos por minha casa, agora me despeço dos queridos leitores! Vou descer as escadas que dão para o jardim, ir até o fundo, passando por todas minhas roseiras, árvores e horta, para chegar até onde estão as galinhas, patos, a porca Ivone, o peru glu-glu, sentar debaixo do pé de limão cravo, me deixar ser levada ao mundo xamânico, para lá manter sempre viva esta minha casa, do jeito que as fotos retratam, e poder voltar sempre que quiser e/ou precisar.
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Não é demais poder conhecer cada ambiente deste casarão da Avenida Paulista, que ficava na esquina com a Rua Ministro Rocha Azevedo?
Melhor ainda, quando as imagens da casa são embaladas pelas histórias e lembranças de Anne de Bonneval, que morou lá, e é neta do proprietário, o Sr. Herculano de Almeida Prado Corrêa Galvão.
E mais, sabendo que tudo isso é inédito, que está sendo publicado pela primeira vez. Não é o máximo?
Por isso, novamente, agradecemos a generosidade de Anne que, mais uma vez, colaborou diretamente com a Série Avenida Paulista.
Rodrigo Lopes
É muito bacana poder ver com o casarão era por dentro. Parabéns!
obrigada, Dora Rossi Cotrim
Que encanto Anne. Obrigada pelo passeio mágico!
Veja Anne de Bonneval
Sofia Almuli Theard lembro qdo vc foi no meu niver e me deu une eau de cologne chamada 4711
Que eu uso até hoje!
casa linda, diferente da maioria das caas da avenida, classica, sem ostentação, da vontade de viver dentro…..
E verdade, a casa tem um estilo mais clean, mais ampla. Muito bonita.
Luciana Cotrim sabe onde se situava e quando foi demolida?
Onde hj é o bco central esquina c a Rocha Azevedo. Demolida em julho/agosto 1973
C.m. Tobias A Anne, que morou lá, já te respondeu acima.
Luciana Cotrim morou là?!
Anne de Bonneval você morou là?!
C.m. Tobias sim! Morei do nascimento aos meus 15 anos! Como poderia fazer um depoimento desses sem ter morado e vivido lá ?
Ah sim, me desculpe, ontem estava disperso, não tinha lido com atenção, legal ter essas memórias!
Espetacular, Luciana Cotrim! Altíssimo nível, esse post, parabéns!
Obrigafda, mas neste caso, o mérito e mais da Anne de Bonneval
Claro, mas tem o seu trabalho de achá-la e coordenar essas histórias e fotos maravilhosas.
Jose Bueno Franco Neto É verdade! Então, muito obrigada por sua gentil mensagem..
Cristine Miyazaki
Viajei no tempo ! Deliciosa crônica!
Milene Assis
Amo esse tipo de matéria, viajo no tempo
Felipe Araujo
Muito bom ! Adoro av. Paulista !!!
Que coisa linda! Me senti dentro dessa bela casa!
Lembro dos aniversários nessa casa histórica linda .
Eu adorei …
e eu lembro tão bem das bagunças q fazíamos. Nos escondiamos de sua mãe que ficava, junto com a minha, horas nos procurando…
Que bom reviver um passado glorioso ??
Marcela Ortegosa
Emocionante!
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ces%C3%A1rio_Cec%C3%ADlio_de_Assis_Coimbra
Caro Flavio, Obrigada pela dica, mas as duas residências citadas no wikipedia já foram publicadas na Série Avenida Paulista. Segue links:
Horacio Sabinho
https://spcity.com.br/serie-avenida-paulista-da-mansao-de-horacio-sabino-ao-conjunto-nacional/
Baronesa de Arary
https://spcity.com.br/serie-avenida-paulista-baronesa-arary-da-nobreza-ao-modernismo-da-decadencia-as-brigas-condominiais/
Caro Flavio, Obrigada pela dica, mas as duas residências citadas no wikipedia já foram publicadas na Série Avenida Paulista. Segue links:
Horacio Sabinho
https://spcity.com.br/serie-avenida-paulista-da-mansao-de-horacio-sabino-ao-conjunto-nacional/
Baronesa de Arary
https://spcity.com.br/serie-avenida-paulista-baronesa-arary-da-nobreza-ao-modernismo-da-decadencia-as-brigas-condominiais/
Deliciosa viagem no tempo! Obrigada Anne de Bonneval, pelo passeio mágico…! Lindas fotos.
Acho maravilhoso este e tantos outros espalhados pela cidade e o que mais me impressiona é a riqueza de detalhes ??
A foto é de um sobrado na Florêncio de Abreu
uma graça.
Fico imaginando até quando teremos o privilégio de ve-los. São tão lindos e imponentes, e os detalhes como vc bem disse são extraordinários, tbm admiro muito.
Sim muito lindo ,,, cheio de história,,,,
Belíssimas casas jamais deveria ser permitida a derrubada da maioria delas, são pedaços de história que deixaram e marcaram o passado como foi um dia está cidade tão bela e de aspecto europeu. Me refiro a limpeza, a classe e ao respeito pela cidade coisa de cidadão que sabe a sua responsabilidade para com o município. Hoje o aspecto não é bem esse principal mente em alguns bairros menos privilegiados. Mas……….fazer o quê???
Thiago Gomes
Ai sim…
Douglas Henrique Dos Santos olha isto
Deve ser maravilhosa ?
Excelente iniciativa de Luciana Cotrim. Só posso parabenizar e agradecer o privilégio de poder participr dessa parte da história de São Pulo. E se fosse possível, solicitar também maiores informações sobre as fazendas de Itu, pertencentes à família Almeida Prado Correia Galvão citadas neste artigo. Agradeço muitíssimo e aguardo.
Ane, eu que agradeço pelo seu gentil comentário. Se quiser conhecer outras histórias das casa da Paulista, você poderá acessar aqui https://spcity.com.br/categoria/sp-antigo-e-moderno/
Quanto à sua pergunta, poderia especificar melhor seu interesse? Eu não tenho informações para lhe fornecer, mas posso mandar para a descendente da família Correa Galvão.
Quantas histórias lindas e emocionantes. Todos esses casarões deviam de ter lindos jardins, pés de frutas. Poder desfrutar de espaço p/ brincar, correr.
As crianças nessa época eram muito felizes, pois tinham contado com que temos de mais belo, a natureza!!
Adorei estas histórias. Moro perto da PAulista desde 1973 e vi muitas dessas residências irem abaixo. Tenho uma curiosidade. A antiga construção que havia onde hoje é o Banco Sudameris, a quem pertencia? Muito passei por ali e via duas senhorinhas andando pelos jardins da casa. Pensava comigo, que pena, isto tem hora marcada para acabar, pois sabia que tão logo as duas, ou uma delas morresse, a casa seria demolida, etc.etc. E não deu outra. SUrgiu o Banco Sudameris com suas estátuas, esquina da Campinas com a Paulista…
Leda, muito obrigada por seu comentário. A casa a qual você se refere era do Comendador Jayme Loureiro. Já escrevi sobre ela na Série Avenida Paulista. Segue o link https://spcity.com.br/serie-avenida-paulista-do-palacete-jayme-loureiro-ao-ed-paulista-1000/
Muito obrigada,
Luciana
Obrigada Luciana pelo retorno. Já localizei o,post sobre a casa a qual me referi.
Agora me ocorreu uma coisa interessante. Uma tia de meu marido, sempre comentava de festas que ia numa casa da Av Paulista, que se situava na avenida no número 5, bem no inicio da Av. ,ela dizia, creio que perto da praça O.Cruz pela antiga numeração. Mas vendo este post da casa da família Galvão, lembrei que o marido desta tia, era Galvão da Costa e Silva. Seria está a tal casa das festas??????